A defesa do legado da Lava Jato, de Deltan Dalagnol e Sergio Moro, passa pela política
2 de setembro de 2020A saída dos dois maiores ícones da chamada “República de Curitiba” e combatentes da corrupção pode levar a Lava Jato ao enfraquecimento.
Com a saída de Deltan Dalagnol, nessa terça-feira (1º), da coordenação da Força Tarefa da Lava Jato em Curitiba, somado ao fato de Sergio Moro não estar mais à frente da 13ª Vara Criminal da Justiça Federal (nem do Ministério da Justiça), o país perde dois dos maiores ícones da chamada “República de Curitiba”, protagonistas que estavam à frente da ribalta do combate a corrupção.
A saída dos defensores da Lava Jato (LJ), em meio a um governo que se elegeu propagando como bandeira o combate à corrupção e cantando em prosa e verso as qualidades da Lava Jato, é inusitado, mas não inesperado, ainda mais pelos novos amigos e companhias adotadas por este mesmo governo.
A palavra mais ouvida da boca dos “partidários” da Lava Jato é que foram traídos, pois esperavam um apoio maior de supostos aliados e antigos apoiadores. Tal sentimento revela uma ingenuidade um tanto infantil e nos evidencia que, não raras vezes, muitas pessoas ainda veem o mundo com lentes cor de rosa.
Não farei aqui julgamentos se a Força Tarefa e o juiz Sergio Moro cometeram excessos ou se são vítimas de injustiça, trarei apenas alguns pontos para reflexão tendo o campo político como norte.
A LJ em vários momentos se encontrou em uma área fronteiriça ou híbrida da política e da justiça, sendo exitosa em muitos momentos, principalmente quando se aproxima do campo da justiça. Porém, ao pender para o campo da política, as regras nem sempre lhe eram claras e assim acumulou alguns reveses.
Os mais recentes podem ter como causa os seguintes pontos:
1) A mídia que sempre deu apoio à LJ tem dedicado sua energia em cobrir as ações relacionadas a pandemia, outras operações de combate a corrupção e os seus próprios problemas com o governo federal, sem contar o desgaste que este último traz para sua credibilidade. Ou seja, está ocupada demais para socorrer os amigos de outrora.
2) A LJ utilizou como combustível os sentimentos anti-establishment e anti petista, dois elementos que não são mais abundantes ultimamente. Os defensores do anti-establishment podem se sentir de alguma forma contemplados pelo governo Bolsonaro e, portanto, menos motivados a promover uma defesa acalorada da Força Tarefa e de seus princípios. Já a motivação dos advogados do anti-petismo arrefeceu porque alguns destes adversários já parecem vencidos ou no mínimo menos relevantes (o partido não comanda mais o país e nenhum candidato do PT lidera as pesquisas de intenção de votos para as eleições deste ano nas capitais).
Caso queiram defender de forma sustentável seus legados na LJ, é indispensável que, após lamber as feridas e absorver os golpes, Deltan e Moro comecem a amadurecer o pensamento político e compreender as limitações e possibilidades de suas novas condições.
Sobre o Autor: Jeulliano Pedroso
Jeulliano Pedroso é Sociólogo, formado pela UFPR, com atualização pela UnB. Foi editor-chefe da Revista Sociedade em Estudos e bolsista do Conselho Nacional de Pesquisa Científica (CNPQ). Possui 13 anos de experiência em gestão de políticas públicas. Atua há mais de 17 anos como Analista e Estrategista Político. É líder RAPS e editor do site estrategiapolitica.com.br.
Mais artigos de Jeulliano Pedroso