Algumas pessoas nas redes sociais começaram a questionar que os dois poderiam ter alguns pontos semelhantes. Será? Veja o que os dados nos mostram.

 

Por conta das mais recentes pesquisas de opinião que apontam um crescimento do apoio ao Presidente Bolsonaro nas camadas mais pobres da população, em decorrência do auxílio emergencial (o “CoronaVoucher”), algumas pessoas nas redes sociais começam a se questionar se ele e o ex-presidente Lula não poderiam se tornar faces opostas de uma mesma moeda, moeda esta que representaria o papel de defensor dos menos favorecidos.

O que os aproximam e os diferenciam?

Antes de avançarmos para esse campo em específico, vale pensarmos em alguns pontos que os aproximam e os diferenciam. Por uma questão de correção analítica farei as comparações utilizando o primeiro mandato de Lula.

Tanto Lula quanto Bolsonaro se elegeram com um forte discurso anticorrupção (se de fato eram/são é outra questão). Ambos são carismáticos (você pode não gostar deles, mas é inegável que encantaram uma legião de fãs) e causadores de amor e ódio com igual intensidade, neste caso não tivemos FHCismo, Dilmismo, muito menos Temerismo, apenas Lulismo e Bolsonarismo.

Lula, no decorrer de seu primeiro mandato, rompeu com uma parte mais ideológica do PT (que veio a fundar o PSOL), reforçou seus vínculos com grupos mais pragmáticos e moderados e ampliou sua base parlamentar recorrendo aos partidos do chamado “centrão” (não gosto muito deste termo, mas na falta de um melhor ficamos com ele). De forma um tanto errática Bolsonaro vem fazendo movimento parecido ao se afastar de parte dos Lavajatistas (representada pela saída do ex-Ministro Sérgio Moro).

Outra semelhança é a grande desconfiança por eles enfrentada durante as eleições que, para superá-la, Lula caminhou para o comedimento, tentando construir uma imagem de estadista. Já Bolsonaro se apega na manutenção da percepção de outsider (à lá Donald Trump), dobrando a aposta no radicalismo.

Lula, para se eleger, abriu os canais de diálogo planejando a construção de uma certa unidade (vide a Carta aos Brasileiros), enquanto Bolsonaro reforçava que não conversaria com as demais forças políticas (“Vamos acabar com tudo isso aí, tá ok?”). Ou seja, Lula se aburguesou com seus ternos de alfaiataria, enquanto Bolsonaro persiste na imagem do improviso e das camisas de futebol. Enganam-se aqueles que desconsideram este aspecto estético e de imagem como importantes na construção simbólica destes atores políticos.

No campo das diferenças, podemos salientar que Lula já era um ator político relevante e bastante conhecido, enquanto Bolsonaro não. Lula possuía uma estrutura partidária forte que lhe dava suporte, diferentemente de Bolsonaro. Inclusive, as aparentes insuficiências de Bolsonaro se convertem em força ao permitir que ele assuma com tanta intensidade o discurso anti-establishment.

Seria ingenuidade apresentar os elementos acima ignorando que o Brasil de 2002/2004 é muito diferente do atual, tanto pela pandemia quanto pelo caráter conflagrado da população. Ao olharmos para o cenário econômico mais amplo lembremos que Lula surfou numa consistente retomada econômica e nós, agora, estamos vivendo umas das piores recessões do século.

Falando do cenário atual, é inegável que Bolsonaro se encontra fragilizado, com algumas denúncias chegando perto de sua família e as instituições (Congresso, STF, etc) cobrando um preço pelo esgarçamento que ele provocou. O risco de um eventual impeachment, mesmo que ainda distante, cresceu.

O atual presidente, junto com o seu núcleo militar, respondeu e convergiu em direção dos mais pobres, uma tática baseada nos ensinamentos da história recente. Lula depois de 19 meses de governo contava com 35% de avaliação como “Ótimo” e “Bom” (Pesquisa Datafolha de agosto de 2004); Bolsonaro com 17 meses de governo conta com 32% nestas mesmas classificações (Pesquisa Datafolha de junho de 2020).

 

Qual a resposta dada naquela época por Lula? Crescimento vigoroso do Bolsa Família que, mesmo lançado em 2003, teve um aumento de 48,7% entre Setembro de 2005 (7,63 milhões de famílias) e Março de 2007 (11 milhões de famílias atendidas) perfazendo um total de 30,8 milhões de pessoas segundo dados do extinto Ministério do Desenvolvimento Social (atual Ministério da Cidadania).

Qual a resposta do Governo Bolsonaro em situação semelhante no presente? Possível criação do programa Renda Brasil, modificação do Bolsa Família se estendendo também aos trabalhadores informais. Além de uma substancial vitaminada no “CoronaVoucher”: no dia 30 de Junho, Bolsonaro anunciou a prorrogação do auxílio por mais dois meses, demandando mais R$ 100 bilhões em investimento.

Programas redistributivos não são exclusividade de políticas de esquerda, mas não estão no DNA da equipe econômica de Paulo Guedes. Mesmo assim, o Planalto já percebeu a importância estratégica da manutenção de um programa desta natureza para que o apoio conquistado seja mantido, porém abre a possibilidade do avanço de outras pautas que lhes são caras.

Afinal, são ou não são faces da mesma moeda?

Apesar dos pontos de confluência é fundamental compreender que Lula e Bolsonaro não são faces da mesma moeda. A principal justificativa para esta afirmação é que o sentimento que movimenta a paixão em torno dos dois líderes é diferente e as pautas que agitam o núcleo duro e a militância de ambos são diferentes em sua essência.

Antes que me acusem de falsas simetrias, lembrem-se que estamos analisando períodos que podem ser comparados, os primeiros 19/17 meses de cada governo. Eles são iguais? Obviamente não! Contudo suas táticas e ações podem seguir caminhos parecidos. Mesmo que as pulsões motivadoras sejam outras o objetivo parece o mesmo: diminuir as chances de afastamento da cadeira presidencial.

Editoria: Análise política